terça-feira, 18 de maio de 2021

A primavera do Dragão – A juventude de Glauber Rocha – Nelson Motta

 “Com 19 anos e ideia fixa em cinema, Glauber se sentia pronto para fazer o seu primeiro filme. O curta seria uma experiência narrativa radical. Sem narrativa. Sem palavras nem música. Sem histórias nem símbolos. Sem razões nem sentimentos. Sem literatura nem psicologia. Influenciado apenas pela poesia concreta, Glauber desenvolveu o roteiro de Pátio imaginando apenas formas e movimentos, luzes e sombras, pretos e brancos. Na trilha sonora, só ruídos, sons eletroconcretistas.

O filme seria estrelada por Helena Ignez, contracenando com o belo Solon, da Escola de Teatro, e filmado em um lindíssimo pátio de um velho casarão na Ladeira Mauá, com piso de cerâmica em preto e branco, como um grande tabuleiro de xadrez cercado de árvores e sombras. E ao fundo o mar da Bahia brilhando ao sol.

Para Glauber, além de cinema poético concretista, Pátio era um filme de amor, para Helena. Para revelar sua beleza e sua presença de atriz.”

“No Rio de Janeiro, Glauber fez a montagem definitiva e acrescentou a trilha sonora ... Pátio foi exibido junto com Caminhos, o primeiro curta do amigo Saraceni, em concorrida sessão-dupla na casa da artista plástica Lígia Pape, com a presença do grande crítico de arte Mário Pedrosa, o artista de vanguarda Hélio Oiticica, o poeta Ferreira Gullar, o escultor Amílcar de Castro e boa parte dos editores do Suplemento Dominical do Jornal do Brasil (SDJB), que era o grande palco, vitrine e tribuna da poesia concreta. Além de muitos artistas e jornalistas, belas mulheres e alguns penetras.

Os dois filmes foram recebidos com grande entusiasmo pelos convidados. Mas ninguém fez mais sucesso do que a exuberante Helena Ignez, a mais festejada da noite, deixando Glauber de olho vivo, faro fino e orelha em pé. Era uma perfeita festa carioca, movida a uíque, jazz e bossa nova, cheia de conquistadores e de mulheres liberais, com pequenos grupos discutindo cultura e política.”


Trechos do livro “A  primavera do Dragão – A juventude de Glauber Rocha”, de Nelson Motta. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. Pags: 160 a 163



Como está na orelha do livro, “Nelson Motta é fascinado por personagens anárquicos, radicais, doidões com causa, artistas notáveis que perseguem seu sonho com potência criativa. Depois de Vale Tudo, a biografia eletrizante de Tim Maia, o jornalista, escritor e produtor musical reconstitui a juventude do cineasta Glauber Rocha, ícone de uma geração excepcional”.


O livro é de fato uma ótima leitura, narrando a infância e juventude de Glauber Rocha, num Brasil que se transformava a passos largos e num ambiente de efervescência política e cultural. Uma época de expansão criativa: bossa nova, cinema novo, poesia concreta, teatro do oprimido e de arena, e diversos outros movimentos de cultura popular. Mas também de carência de recursos e pleno de improvisações, tanto que o lema do cinema novo era “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”.


Glauber propõe uma nova forma de fazer cinema: nada de cenários e medalões. Inspirado no realismo italiano, usa locações do mundo real que retrata. Valoriza a dramaturgia, o argumento e personagens do povo. E foi com muita garra, improvisação e parcos recursos que conseguiu levar o seu Deus e o Diabo na Terra do Sol para o Festival de Cannes, um dos mais notáveis palcos do cinema no planeta, onde se consagrou.


Nelson Motta fez inúmeras entrevistas e acessou preciosos arquivos de amigos e familiares de Glauber. Escreveu o livro com seu jeito dinâmico e fluido de narrar, com humor e maestria. O livro, mais do que uma biografia, é um retrato de uma época onde o sonho embalou corações e mentes. Uma biografia em ritmo de romance, fazendo um recorte da vida de Glauber, partindo do  seu nascimento, passando pela infância e juventude, até o seu desabrochar como vulcão criativo, falastrão e libertário, que muito contribuiu para moldar a cultura brasileira. 


Boa leitura e diversão!

Por F@bio

quarta-feira, 14 de abril de 2021

Fragmentos de memórias malditas: invenções de si e de mundos - Cecília Coimbra

"Falar daqueles três meses em que fiquei detida - incomunicável e sem um único banho de sol ou qualquer outro tipo de exercício - é falar de uma viagem ao inferno: dos suplícios físicos e psíquicos, dos sentimentos de desamparo, solidão, medo, pânico, abandono, desespero; é falar da 'separação entre corpo e mente', como afirmava o psicanalista Helio Pellegrino: 'O corpo implora para que se fale, a mente proíbe que isso ocorra'. A tortura não quer apenas fazer falar, também quer calar. Este foi o esgarçamento que experimentei: a terrível situação que opera através da dor, da humilhação e da degradação, transformando-nos em coisa, em objeto. Resistir a isso, não perder a lucidez e não permitir que o torturador penetre em nossa alma, em nosso espírito, em nosso pensamento e domine o nosso corpo exige um gigantesco esforço.

...

Apesar do massacre de toda e qualquer oposição, a vida insiste. Os anos seguintes foram de muita solidariedade, especialmente com meus irmãos e amigos mais próximos. Ocorreu uma grande aproximação. Passamos a morar próximos uns dos outros. Viajávamos de férias juntos e confraternizávamos em datas festivas - um congraçamentos muito forte, com muita união e muita alegria por estarmos juntos e vivos.

...

A inquietude e o combate com linhas duras animam a minha existência. Uma experiência de vida marcada por sucessivos abalos em torno da construção de ética-estética da liberdade na invenção de um viver potente. Não me conformo com a mutilação de uma vida pacificada para caber na caixa do mundo já estabelecido. Sinto a faísca da vida que me incendeia nos encontros que experimento com alunos, livros, autores, companheiros, amigos. Porém, durante muitos anos, tinha um sentimento muito forte de que nunca mais veria os amigos exilados ... Sentia um peso muito grande, que se desfez aos poucos ao longo dos anos - com a anistia, ao rever os companheiros-amigos, com os pensadores-intercessores, com os alunos: enfim, com novos e bons encontros que aumentam nossa potência de existir.

Movida pelos bons encontros sigo em busca de mais ar. Afetada pela pandemia do Coronavirus busco refugio na serra de Friburgo, em um pequeno ponto do planeta Terra onde a mata Atlântica resiste e insiste em sua acolhida multicor. Este foi o território que me acolheu e me implusionou em direção à escrita deste texto. Pássaros, flores, sapos, cobras, borboletas, aranhas, vagalumes e insetos variados passam a atravessar meus dias... Que essas memórias possam seguir afetando-desdobrando e seja, também, um pouco do possível, um pouco de ar para outras resistências e invenções de si e de mundos"

Trechos do livro "Fragmentos de memórias malditas: invenções de si e de mundos", de Cecília Coimbra. São Paulo: N-1 Edições, 2021.

Cecília Maria Bouças Coimbra é historiadora formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e psicológa pela Universidade Gama Filho, mestre pela Universidade Candido Mendes, com doutorado em psicologia na Universidade de São Paulo (USP), pós-doutorado em ciência política também na USP. Professora aposentada de psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e uma das fundadoras e atual participante da Diretoria Colegiada do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro.. É autora também do livro "Guardiães da Ordem, uma viagem pelas práticas psi no Brasil do milagre", publicado pela Editora Oficina do Autor, em 1995 (esgotado e disponível on line).

O livro de memórias do período em que esteve presa sem qualquer processo judicial, se baseia no próprio depoimento da autora às comissões Nacional e Estadual da Verdade, sendo ainda inspirado em sua tese de doutorado. O livro também é um marco dos seus 80 anos, nos quais lutou por ideiais de um mundo mais justo e pelo direito à verdade, à justiça e à dignidade humana. Como ela mesmo diz: falar das memórias "malditas e perigosas dos vencidos" é ainda doloroso e muito difícil, mas cada vez mais "absolutamente necessário".

Cecília fala daquelas memórias "que não contam nos livros oficiais e que o Estado tenta incessantemente fazer desaparecer, ainda hoje insistem em nossos corpos. São histórias que fazem parte de nossas vidas e que continuam a ferro e fogo", e continua: "Sinto necessidade de escrever para liberar a vida. Só consigo seguir em frente no abalo que constantemente tira tudo do lugar novamente. Em uma fina sintonia entre Leibniz e Deleuze: na chegada ao porto eis que sou lançada novamente em alto mar".

Mãe, avó, militante dos direitos humanos, professora universitária, historiadora, cientista política e psicóloga, Cecília Coimbra é uma potência. A fundadora e principal referência do grupo Tortura Nunca Mais fala mais sobre sua vida e o livro na ótima entrevista à Carta Capital (https://www.cartacapital.com.br/sociedade/nao-tenho-mais-ilusao-de-revolucao-minha-afirmacao-e-a-vida-cotidiana/).

Como Cecília também me refugio na serra de Nova Friburgo buscando um pouco mais de ar e acolhida da natureza. Mas resistir é luta cotidiana, sem tréguas, pela liberdade, pela justiça, pela vida. Sobretudo nesses tempos sombrios e de múltiplas pandemias (na saúde, na sociedade, na política...), é ato de sanidade, fé e coragem.

E resistir é preciso. Boa leitura!

Por F@bio

segunda-feira, 5 de abril de 2021

Guerreiro Camaleão, O soldado do Kaiser - Germano Schinkoeth Reis

"Duas horas direitinho, nós aguentamos no mais terrível fogo de granadas. Por sorte, a maioria passava por cima de nós. Escutamos altos brados de comando lá na frente, eram os pioneiros que tinham terminado o serviço de demolição. Ordeno a retirada. Retornamos, aproveitando grande parte da vala como proteção. Dois homens mal conseguiam andar. O fogo inimigo estava tão forte que, na retaguarda, ficaram admirados com a nossa chegada e com a missão cumprida.
... Porto de Bremen, setembro de 1880. Consegui emprego como foguista no vapor 'Berlin'. Tive que pagar doze marcos para o oficial que contrata os marinheiros. Era meu último dinheiro, sobrou apenas um marco. Eu pensava em ir para a América, Austrália ou África. Mas o navio vai para o Brasil, para a América do Sul.
... Em uma pequena venda, mais voltada para o comércio de bebidas, conheci Otto, um ferreiro, que está há mais de dois anos em São Paulo e também só conseguiu juntar umas poucas economias. Ele disse que vai tentar a sorte na Amazônia (...) [onde] está existindo um eldorado da borracha e muitos estão ficando ricos com ela ... Falou-me também de uma região no interior do Rio de Janeiro, um pouco ao norte, onde existia outro eldorado verde, o do café. Argumentei com ele, como pode ser ouro verde, se o café é preto? Ele explicou que naquela região montanhosa, todos os morros estavam cobertos de cafezais de um tom verde muito bonito, e que na época da floração, ficavam brancos de flores, como um brilho. Como estava gerando muitas riquezas, apelidaram-no de 'ouro verde'.
... Agora vejo a vida como um tabuleiro de xadrez, com suas peças dispostas de forma ordenada. As mais importantes ficam atrás, mais protegidas. A linha de frente, a dos peões, é a primeira a ir para o sacrifício, sem piedade. Com isso fica fácil entender que só os grandes lances, os mais inteligentes e incomuns podem levar à vitória. Sinto que estou fazendo isto agora.
... Quando está acontecendo uma grande guerra, que direta e indiretamente afeta quase todos, por vezes até mesmo quem se encontra distante, é dificil que esse assunto não faça parte de quase todas as conversas. Sabendo de minha participação na [guerra] Franco - Prussiana, Zambrotti, quase que suplicando, insistiu para ouvir como é uma guerra por dentro, contada em detalhes, sem mentiras ou exageros que tanto aparecem nos jornais. Pensei um pouco antes de responder e fui bem claro. - Escute bem, Zambrotti. Prefiro não falar sobre isso, porque não são boas lembranças. Mas vou te contar sobre algo melhor, não sei se na sua terra natal existe alguma coisa parecida. Também não sei se era uma tradição familiar ou regional de onde nasci; bem ao norte, quase na fronteira com a Polônia. Sempre que um rapaz terminava os estudos de sua profissão, antes de começar a trabalhar, tinha que fazer uma espécie de iniciação para a vida. Ela consisitia em uma peregrinação solitária, sem dinheiro, munido apenas de um cajado e uma pequena trouxa de roupas. Eu realizei aos dezesseis anos de idade, logo após minha formatura. (...) Meu pai me entregou o cajado que ele e meu avô já tinham usado, e me explicou que era para cultivar três virtudes: liberdade, humildade e coragem. Já adulto é que compreendi melhor esses valores, que muito me ajudaram a vencer na vida. Quanto à liberdade, era para cortar o cordão umbilical com a família. Descobrir seu grande valor, e sempre fazer por onde nunca perdê-la. Quanto à humildade, cultivada pedindo comida nas casas, era para aprender a não ter vergonha de pedir ajuda, mas sem se curvar, sem subserviência. Por fim, a coragem. Para enfrentar a vida sem medo, sem se acomodar, caminhando sempre em frente, em busca de um sonho a ser realizado. Foram dois meses caminhando pelo norte da Alemanha. Quando retornei, senti que já era um homem, pronto para enfrentar a vida."
Trecho do romance biográfico "Guerreiro Camaleão - O soldado do Kaiser", de autoria de Germano Schinkoeth Reis. São Paulo: All Print Editora, 2013.
Germano Schinkoeth Reis é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que "encontrou na cirurgia plástica e reparadora sua realização profissional". Militou na política e foi vereador por três mandatos, de 1993 a 2004, no município de Natividade (RJ), chegando a ser presidente da Câmara Municipal. Autor ainda do livro "Medicina Simples - Orientações e Medicações", pela Editora Vozes (2000).
O livro é baseado nos diários do avô do autor, o empresário germânico Carl Heinrich Schinkoeth, nascido em 1851, em Beneschau/Schleisien - Alemanha, e falecido em 1928, em Natividade (RJ). O médico Germano S. Reis revelou-se um ótimo escritor que conseguiu dar um ritmo de aventura aos diários do avô. Como consta da contracapa do livro "Grandes escritores conseguem transformar biografias simples, com histórias comuns, em excelentes e famosos romances. Aqui se encontra quase o inverso, isto é, em linguagem simples, conta-se uma história riquíssima; quase inacreditável, mas verdadeira. Para não torná-la longa e enfadonha, a maior parte das anotações do personagem (quatro volumes em alemão) foi cortada para não cansar o leitor".
A trajetória de Carl começa a ser relatada com a sua participação na guerra Franco - Prussiana. Um jovem soldado que no front lidera seus companheiros e é condecorado com a mais alta distinção de bravura da época, a Cruz de Ferro, da qual ele, ao longo da vida, não irá se vangloriar. Pelo contrário, como no trecho acima transcrito, evitará falar sobre a guerra porque "não são boas lembranças". Após sua participação no conflito, ele irá trabalhar em condições muito duras em seu país, até decidir buscar melhores perspectivas no exterior. Por um acaso da vida e também pela falta de dinheiro, acaba embarcando num navio para a América, não a do Norte e sim a do Sul, vindo parar no Brasil, aportando em Santos, onde consegue fugir do inferno que era trabalhar de foguista nos porões da embarcação, sendo tratado praticamente como um escravo. No Brasil, um conterrâneo lhe informa sobre duas opções para ganhar dinheiro com "ouro verde": a borracha na Amazônia e o café no norte do Estado do Rio de Janeiro. Ele vai para a Amazônia e consegue ganhar dinheiro. Depois, volta para sua amada, Anna, que deixara na Alemanha. Mas a vida lá não estava fácil e Carl convence Anna a vir com ele para o Brasil, indo morar em Manaus, onde se torna industrial. Todavia, Anna não se adapta ao clima quente e úmido da cidade. Carl decide então ir em busca do outro "ouro verde". De trem chega a Natividade e lá se estabelece como comerciante e, após conhecer a serra de Varre-Sai de onde vinham tantas tropas de mulas carregadas de "ouro verde", exportador de café.
Como afirma seu neto, Germano, Carl Schinkoeth "no período da guerra que lutou, em que não se vangloriou de seus feitos, também [não] o fez no período em que se aventurou intrepidamente pela Amazônia e no mundo dos negócios, onde, de certa forma, existe um outro tipo de guerra, mas de inteligência e esperteza na disputa pelo dinheiro".
Me envolvi com a pesquisa genealógica - um vício - e por tal razão estou sempre pesquisando minhas origens. Nasci numa fazenda de café justo em Varre-Sai, e foi uma maravilha ler o livro e conhecer o relato de Carl ao subir a serra rumo às plantações de café no final do Século XIX. Trata-se de um período carente de relatos da geografia e economia da região e o livro trás um importante contribuição para conhecermos um pouco mais da vida regional na época. Aliás, a literatura é cada vez mais reconhecida como rica fonte de pesquisa histórica.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Quarto de despejo - Carolina Maria de Jesus

"...A tontura da fome é pior do que a do alcool. A tontura do alcool nos impele a cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi que é horrível ter só ar dentro do estomago.

Comecei a sentir a boca amarga. Pensei: já não basta a amargura da vida? Parece que quando eu nasci o destino marcou-me para passar fome. Catei um saco de papel. Quando eu penetrei na rua Paulino Guimarães, uma senhora me deu uns jornais. Eram limpos, eu deixei e fui para o depósito. Ia catando tudo que encontrava. Ferro, lata, carvão, tudo serve para o favelado. O Leon pegou o papel, recebi seis cruzeiros. Pensei guardar o dinheiro para comprar feijão. Mas, vi que não podia porque o meu estomago reclamava e torturava-me.

... Resolvi tomar uma media e comprar um pão. Que efeito surpreendente faz a comida no nosso organismo! Eu que antes de comer via o céu, as arvores, as aves tudo amarelo, depois que comi, tudo normalizou-se aos meus olhos.

...

Quando puis a comida o João sorriu. [Os filhos] Comeram e não aludiram a cor negra do feijão. Porque negra é a nossa vida. Negro é tudo que nos rodeia.

...

Quando eu fui catar papel encontrei um preto. Estava rasgado e sujo que dava pena. Nos seus trajes rotos ele podia representar-se como diretor do sindicato dos miseraveis. O seu olhar era um olhar angustiado como se olhasse o mundo com despreso. Indigno para um ser humano. Estava comendo uns doces que a fabrica havia jogado na lama. Ele limpava o barro e comia os doces. Não estava embriagado, mas vacilava no andar. Cambaleava. Estava tonto de fome.

...

... Eu escrevia peças e apresentava aos diretores de circos. Eles respondia-me:

- É pena você ser preta.

Esquecendo eles que eu adoro a minha pele negra, e o meu cabelo rustico. Eu até acho o cabelo de negro mais iducado do que o cabelo de branco. Porque o cabelo preto onde põe, fica. É obediente. E o cabelo de branco, é só dar um movimento na cabeça ele já sai do lugar. É indisciplinado. Se é que existe reincarnações, eu quero voltar sempre preta.

...

... As oito e meia da noite eu já estava na favela respirando o odor dos excrementos que mescla como barro podre. Quando estou na cidade tenho a impressão que estou na sala de visita com seus lustres de cristais, seus tapetes de viludos, almofadas de sitim. E quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar num quarto de despejo.

...

... A noite está tepida. O céu já está salpicado de estrelas. Eu que sou exotica gostaria de recortar um pedaço do céu para fazer um vestido."


Trechos do livro "Quarto de despejo: diário de uma favelada", de Carolina Maria de Jesus. São Paulo: Ática, 2014.


Carolina Maria de Jesus (1914 - 1977), mãe solteira de três filhos, nascida em Sacramento (MG), foi catadora de papel e outros produtos descartados pelos moradores e comerciantes. Morou na favela do Canindé, a beira do rio Tietê, na cidade de São Paulo, favela desocupada em meados da década de 1960. Semianalfabeta, que só pode cursar até o segundo ano do ensino primário, era "apaixonada por livros, ela alimentava sonhos e desabafava a sua triste realidade nas folhas encardidas de seus cadernos". Os diários foram descobertos pelo jornalista Audálio Dantas, que foi à favela para fazer uma reportagem. Logo percebeu a originalidade dos textos de Carolina e reproduziu trechos do livro em suas reportagens. Depois conseguiu a publicação na forma de romance, com a grafia original da autora, que obteve muito sucesso e foi traduzido para treze idiomas. 


Como diz Audálio Dantas, no prefácio da edição em comento: "O sucesso do livro - uma tosca, acabrunhante e até lírica narrativa do sofrimento do homem relegado à condição mais desesperada e humilhante da vida - foi um sucesso pessoal de sua autora, transformada de um dia para outro numa patética Cinderela, saída do borralho do lixo para brilhar intensamente sob as luzes da cidade". E prossegue dizendo que o "cenário em que foi escrito o diário já não é o mesmo. Parte dele deu lugar ao asfalto de uma nova avenida, por coincidência chamada de Marginal. A Marginal do Tietê, que passa por ali onde até meados dos anos 1960 se erguia o caos semiurbano e sub-humano da favela do Canindé, em São Paulo. O resto foi ocupado por construções sólidas, ordenadas, limpas, aprumadas no lugar dos barracos cujos ocupantes foram para outros cantos da cidade, para outros quartos de despejo". E continua afirmando que "a favela do Canindé multiplicou-se em dezenas, centenas de outras. Assim, Quarto de despejo não é um livro de ontem, é de hoje. Os quartos de despejos, multiplicados, estão transbordando."

Pouco mais é preciso dizer sobre esta obra que foi classificada como um exemplo de "literatura verdade", relatando a vida cruel de parte da cidade partida, onde vivem os excluídos dos bônus, mas incluídos nos ônus da sociedade. A narrativa de Carolina das agruras da vida de uma marginalizada nos anos 1950 parece cruelmente atual quando nos deparamos com as inúmeras habitações em condições sub-humanas existentes em praticamente todas as grandes e médias cidades do país. O Brasil de grandes riquezas permanece enormemente desigual.

Mas o que mais me marcou no livro foi o relato da fome. A fome em meio a abundância. É duro ler o relato da dor de não ter o que dar de comer para os filhos, a não ser uma rala sopa de ossos obtidos na lixeira do frigorífico. O ser humano conseguiu formar uma sociedade de exclusão, na qual 2.153 bilionários do mundo têm mais riqueza do que 4,6 bilhões de pessoas – ou cerca de 60% da população mundial, segundo relatório da Oxfam do início de 2020.

Boa leitura e reflexão!


Por F@bio


segunda-feira, 8 de março de 2021

A resistência - Julián Fuks

"Meu irmão é adotado, mas não posso e não quero dizer que meu irmão é adotado. Se digo assim, se pronuncio essa frase que por muito tempo cuidei de silenciar, reduzo meu irmão a uma condição categórica, a uma atribuição essencial: meu irmão é algo, e esse algo é o que tantos tentam enxergar nele, esse algo são as marcas que insistimos em procurar, contra a vontade, em seus traços, em seus gestos, em seu atos. Meu irmão é adotado, mas não quero reforçar o estigma que a palavra evoca, o estigma que é a própria palavra convertida em caráter. Não quero aprofundar sua cicatriz e, se não quero, não posso dizer cicatriz.

...

Na minha lembrança os olhos do meu irmão estavam lacrimosos, mas desconfio que essa seja uma nuance inventada, acrescida nas primeiras vezes que rememorei o episódio, turvado lá por algum remorso. Ele estava sentado no banco da frente. Se chorava, decerto continha qualquer soluço e escondia as lágrimas com as mãos; ou voltava o rosto para a janela, extraviava a vista em presumíveis pedestres. O caso é que não olharia, não viraria para trás. Talvez fossem os meus, os olhos, lacrimosos.

...

É preciso aprender a resistir. Nem ir, nem ficar, aprender a resistir. Penso nesses versos em que meu pai não poderia ter pensado, versos inescritos na época, versos que lhe faltavam ... Resistir: quanto em resistir é aceitar impávido a desgraça, transigir com a destruição cotidiana, tolerar a ruina dos próximos? Resistir será aguentar em pé a queda dos outros, e até quando, até que as pernas próprias desabem? Resistir será lutar apesar da óbvia derrota, gritar apesar da rouquidão da voz, agir apesar da rouquidão da vontade? É preciso aprender a resistir, mas resistir nunca será se entregar a uma sorte já lançada, nunca será se curvar a um futuro inevitável. Quanto do aprender não será aprender a perguntar-se?


Trechos do romance "A resistência", de Julián Fuks. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.


Julián Miguel Barbero Fuks é paulistano, nascido em 1981, filho de pais argentinos. É graduado em Jornalismo, com mestrado em Letras e doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo (USP). Crítico literário e jovem autor de algumas obras premiadas: "História de literatura e cegueira" (2007) e "Procura do romance" (2012), ambos finalistas dos prêmios Jabuti e Portugal Telecom; "A Resistência" (2015) ganhador dos prêmios Jabuti e Literário José Saramago. 

Em sua ficção, mesclada com fundas reflexões e memórias autobiográficas, o autor nos traz o delicado e complexo tema da adoção, no caso de um irmão mais velho, anterior ao seu nascimento, quando os pais residiam em Buenos Aires. Tempos tensos em que a resistência por vezes exige recuos, retiradas, exílio. Os pais fogem apressados de uma ditadura a outra, mas esta, a do Brasil, deveria ser transitória, de passagem para outros destinos. Mas a cidade acolhe e resistir também é ficar. Os pais acabam sendo adotados por São Paulo, onde fixam residência e têm outros filhos. 

O próprio autor, em entrevista à revista Cult, nos conta que o título inicial, que seria "O irmão possível", acabou sendo abandonado e "A resistência" se impôs: "... surgiu e me pareceu complexo o bastante, porque há muitas resistências ao longo do livro. Pode não estar mencionada assim. A resistência dos pais à ditadura militar é a mais imediata, mas há a resistência do irmão ao convívio familiar, a resistência do narrador ao contar essa história. Então tem uma série de resistências atravessando o livro e é aproximando dessa noção mesmo: de resistir como um ato simples de existência, existir e resistir como duas coisas muito relacionadas. Hoje está se fazendo muito esse trocadilho com o reexistir: voltar a existir. Resistir seria uma forma de voltar a existir. Gosto, especialmente, do que a palavra tem de ambivalente: resistência como algo negativo, como uma recusa a alcançar algo ou, pelo contrário, como um ato de força, de posicionamento diante de uma situação que exige uma tomada de posição. Eu gosto de pensar a literatura como capaz de fazer essa transição: do sentido mais negativo de resistência para o sentido mais positivo. Por meio da escrita a gente pode transformar uma resistência na outra". (Lei a entrevista completa em: https://revistacult.uol.com.br/home/o-brasil-e-incapaz-de-refletir-sobre-seu-passado-diz-julian-fuks/)

O ato de resistir é a luta cotidiana pela existência e pela liberdade, é a busca sem tréguas pela vida, e isso exige se contrapor a quem prega a morte e a submissão. Sobretudo nesses tempos de desvalorização da vida e supressão da liberdade, resistir é preciso, necessário, é ato de fé e coragem.

E resistir também é ler um livro. Uma ótima leitura e vamos resistir!

Por F@bio


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Seu amigo esteve aqui - Cristina Chacel

"Aos 21 anos, quando entra para a Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde vai estudar sociologia e política, Beto já é um homem-feito. Porte atlético nos seus um metro e oitenta centímetros de altura e dono de um estonteante par de olhos verdes, arranca suspiros das garotas ao passar. Inteligente, bem humorado, gosta de andar bem-vestido, chama a atenção por isso. É um tipo amável, fácil de lidar, que se adapta rapidamente aos novos ambientes. Em pouco tempo, torna-se popular. Todo mundo o conhece na UFMG, a primeira escala de uma trajetória revolucionária que o levaria, em dez anos, à condição de desaparecido político da ditadura militar brasileira."

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"Vem dele, Sergio, a vontade de contar a história de Breno. Depois daquela manhã de 15 de fevereiro de 1971, ele nunca mais foi visto. Não se sabe, até hoje, como foi preso. Há poucos testemunhos sobre seu paradeiro. O mais provável foi revelado à militante e amiga Inês Etienne Romeu, quando esteve presa em um centro clandestino de tortura na serra fluminense de Petrópolis, que ficou conhecido como Casa da Morte. Lá, um dos agentes lhe confidenciou: 'Seu amigo esteve aqui.' Por sinistra coincidência, esse torturador havia sido jogador de basquete, em Belo Horizonte, na mesma época em que Carlos Alberto Soares de Freitas - conhecido então por seu apelido, Beto - atuava nas quadras. E ambos teriam se reconhecido."

...

"Passados quarenta anos, ela se esforça para lembrar o que treinou esquecer. Como a última vez que viu Breno ela estava no Rio, de passagem, para participar do Festival de Teatro da Aldeia de Arcozelo, em Paty do Alferes, cidade do interior fluminense. Caminhava por Copacabana quando, de repente, se vê frente a frente com Breno. Um susto! Os dois se abraçam e Breno, ao saber que ela estava ali para um festival de teatro, tem um impulso:

- Eu vou te dar um livro! - diz.

Em seguida, ele entra com Margaret numa livraria perto dali e compra para ela um exemplar de Perseguição e assassinato de Jean-Paul Marat, de Peter Weiss. Primeiro grande sucesso do dramaturgo alemão, a peça de 1964 mergulha no conflito entre a individualidade e a necessidade da revolução. Bem guardado por Margaret até os dias de hoje, o livro não tem dedicatória, como era de se esperar de quem não pode deixar rastros..."



Trecho do livro "Seu amigo esteve aqui: a história do desaparecido político Carlos Alberto Soares de Freitas, assassinado na Casa da Morte", de autoria de Cristina Chacel. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.



A jornalista Cristina Chacel esteve nas principais redações dos jornais do Rio de Janeiro: O Globo, Jornal do Brasil, Última Hora, Rádio JB, nos quais atuou como repórter, redatora, editora e colunista nas áreas de economia e tecnologia. Depois seguiu carreira como jornalista independente trabalhando em comunicação corporativa e institucional, marketing político, projetos sociais e solidários. Entre outros livros, Cristina lançou ainda "Janelas Abertas", em coautoria com o fotógrafo Rogério Reis; "Centro", da Coleção Bairros do Rio (Neighborhoods);  "O tatu saia da toca- histórias da internacionalização da Petrobrás"; "Arte e Ousadia"; "Rio de Contos 1000" e "Guanabara espelho do Rio", os dois últimos em coautoria com o marido e fotógrafo Custódio Coimbra. E ainda vários livros publicados com temáticas em políticas públicas e projetos sociais e solidários do Rio de Janeiro. 


Como lembra Álvaro Caldas no prefácio de "Seu amigo esteve aqui": "Vinte e sete anos depois que retornou à democracia, o Brasil ainda luta para desenterrar um doloroso legado perdido que, aos poucos e a duras penas, vem sendo reconstituído".

Cristina faleceu em 28 de julho de 2020 a tempo ainda de viver o grande retrocesso nessa luta. Felizmente com sua ampla pesquisa e relato, a história de Beto e de seu tempo foi por ela muito bem desvelada no livro em comento. 

Ainda segundo Álvaro Caldas: "Como se fosse um romance de não ficção, intercalando investigação jornalística, autobiografia e crônica, na fronteira entre os fatos e o relato ficcional, o texto segue os passos do mito criado em torno de um militante desparecido para devolvê-lo à história real. Eis então que temos de novo entre nós o 'nosso amigo' guerreiro, o que pode não ser um consolo, mas oferece uma valiosa contribuição para a construção da Verdade, e é um soco na cara dos carrascos que o assassinaram".

Também cursei Ciências Econômicas, mas na Universidade Federal Fluminense em Niterói. Ingressei em 1975, tempos da ditadura e época em que o coordenador do curso havia sido preso e era mantido incomunicável. Participei da iniciativa de criação de uma cooperativa de livros e, indo a Belo Horizonte, fui a UFMG conhecer a renomada cooperativa que lá existia justo na mesma faculdade em que Beto estudou. Na época não sabia da sua história, como poderia saber?

Conheci Cristina há pouco tempo, mas o suficiente para saber que ela era uma pessoa alegre e lutadora, que sabia traduzir em palavras as emoções de momentos especiais e comover os que estavam ao seu lado. Lutou no jornalismo, na ecologia, nos sindicados e organizações sociais, na política e contra um câncer, nem todas venceu, mas deixou um inestimável legado, como o livro resgate da história de Carlos Alberto Soares de Freitas. Com um texto muito bem costurado, onde cria um clima de suspense ao narrar uma história verídica de um militante desaparecido político no obscuro período da ditadura militar no Brasil.

Com ampla pesquisa em arquivos públicos e pessoais, depoimentos e reportagens de época, Cristina trás a luz a luta de um idealista contra o autoritarismo e as sombras do regime autoritário de 1964. Carlos Alberto Soares de Freitas, o Beto ou Breno foi um dos três militantes homenageado por sua companheira de lutas que viria a ser presidente da república, Dilma Rousseff. Numa narrativa envolvente, o livro é importante contribuição para desvelar uma parte da história brasileira que alguns tentam esconder, para não revelar suas atrocidades como agentes do estado brasileiro. 

Um belo resgate da verdade e revelador das masmorras que não podem ser ignoradas como querem os atuais ocupantes do governo federal no Brasil.

Boa leitura e reflexão para todos!

Por F@bio


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

A Viragem dos Ventos - Maruza Bastos

"...Ela todo sorrisos, esforçava-se para se integrar à turma. Tudo corria bem até a conversa descontraída virar uma curva fechada e engrenar na perigosa direção de uma cumplicidade engajada. Não tinha estofo para compartilhar. Isolou-se intimidada com a desorientação que precisava urgentemente disfarçar. Emudeceu, amordaçando a ignorância; o fulgor de seu rosto desaparecia quanto mais se refugiava. Envergonhou-se. A seus olhos, a falta de saber lhe pareceu inconcebível. O que sucedera com a vitalidade juvenil, a que viera se assegurar junto às autoridades médicas do Rio? Levantou-se. Não foi fácil manter o corpo ereto e os passos firmes.

...

Veio à tona o êxtase vivido nos dias presentes. O sentido e a beleza da alforria que experimentara no Rio. Horizontes impensados se descortinavam diante dela como estrelas novas que nasciam. Não, nada disso poderia ser pecado, nem induziria a sacrifícios de mortificação. Um fio ligava a liberdade conquistada à tradição de sua história daqueles dias longínquos. Esse encontro desencontro pulsava, contração expansão; o universo no peito batendo, contração expansão; o sentido da existência, contração expansão; o bombear do coração, contrair expandir.

Esse todo verdade de repente a invadiu com uma garra insondável pela vida. Revirado em júbilo, o sentimento se verteu em clara evidência. Ainda tenho um amor novo inteiro para viver, murmurou, abstraindo em reza a força da devoção. De onde surgia tamanho arroubo que arremessava para longe os traços de sua fraqueza?"


Trechos do romance A Viragem dos Ventos, de Maruza Bastos. Rio de Janeiro: Ape'Ku Editora, 2020.


Maruza Bastos é carioca, psicóloga e psicanalista que realizou sua formação na Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle da cidade do Rio de Janeiro, onde atua. Mestre e Doutora em Psicologia, foi professora universitária, pesquisadora e atuou também na justiça da infância e adolescência. É autora ainda dos livros "Olhos de Serpente", romance de 2015, e "Cárcere de Mulheres",  dissertação de 1997. Publicou os contos: "O Cofre de Extima" (2009), "Bicho Solto" (2011) e "Carta ao Irmão" (2015). Alguns desses e outros de seus escritos estão registrados em www.freudeslizar.blogspot.com.



No romance A Viragem dos Ventos, a protagonista - Gigi - é uma ex-modelo de sucesso que deu uma virada para uma vida burguesa e pacata no campo, casando-se com rico fazendeiro e passando a morar em Cuiabá com o marido e um casal de filhos. Tendo a beleza como uma preocupação central em sua vida, decide fazer um checkup com especialistas no Rio. Mas antes programa uma parada em São Paulo para reencontrar amigas e, quem sabe, amores do passado.

Ao chegar no Rio, seus planos são atravessados por um turbilhão de acontecimentos. Novas amizades, novas experiências, novos questionamentos, novas aventuras. Essa tempestade de acontecimentos surge como um vendaval que se contrapõe ao tradicionalismo e a mesmice da vida de Gigi. Diante dessa ebulição, afloram desejos reprimidos: "ela atravessa o mar pulsional de sua existência", em meio a ativismos político, ambiental, existencial que insuflam "no espírito de cada um a urgência de uma escolha" e o amor nem sempre é a escolha mais óbvia e simples.

Uma ótima leitura e que os bons ventos da viragem cheguem em breve nesses tempos de isolamento e pandemias.

Por F@bio