De: João Luís Barreto Guimarães
"Imóvel na ponte aberta sobre este porto de mar
queria não ter que esperar que o petroleiro passasse
a vomitar outro preto nos depósitos da Cepsa.
Olho as margens da tarde em informe ebulição
o navio japonês veio dar à luz Toyota’s
alinhados sobre o cais qual parada militar
(os turistas dos cruzeiros aguardam pelo autocarro
que lembrará em sueco memórias do Porto antigo).
Do cargueiro africano rolam troncos gigantescos
houve um que caiu à água e ninguém o foi salvar
(decerto não irá longe nestas águas estagnadas
nem poderá ir mais ao fundo).
Corre um vento de norte. Novembro
está dentro do Outono. Alguém reuniu o manto
de folhas cerca da ponte mas pelo final do dia
já é Outono outra vez. Mas
distraí-me do cais. Espera. Lá está a marinha.
A fragata da Defesa devolveu homens à terra
meio-dia de licença na casa da luz vermelha
(este Natal as meninas vão-lhes dar a provar sonhos
e o porteiro: rabanadas). E se
faltam desrazões para me obrigar a parar
aqui me têm parado
(só reparando se vê)
qualquer amurada é perfeita para resumir um país
qualquer ponte é ideal para se matar
os tempos."
Poemas extraídos da revista POESIA SEMPRE, Num. 26, Ano 14, 2007. Edição da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.
João Luís Barreto Guimarães nasceu no Porto, a 3 de Junho de 1967. Vive em Leça da Palmeira. Tem uma filha. É licenciado em Medicina e Cirurgia pela Universidade do Porto, especialista em Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.
Obtido de: http://www.antoniomiranda.com.br/iberoamerica/portugal/joao_luis_barreto_guimaraes.html
O poeta e médico João Luís no seu poema cria imagens incríveis, como a do navio japonês que pariu toyotas. Passando por outra ponte, que não a de Leça da Palmeira, mas na Rio - Niterói, vê-se o navio italiano não parindo, mas abocanhando, ou para ser mais atual, extraditando fiats, mercedes, citroens e outros rodantes. Mas, nessa ponte não se mata o tempo apreciando o correr das águas ou o bater das ondas, mata-se o tempo em engarrafamentos, matam-se os motoristas e passageiros em colisões, vidas que se vão na nau dos espíritos. No cais desse porto também não dá para distrair-se sentido a brisa do vento norte e o aroma marinho, é um cais sujo, fedido, mal-tratado, como quase todo cais, de águas estagnadas, certamente muito mais do que a Leça da Palmeira que um dia pretendo conhecer.
Por
F@bio
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